Revolução e luta Sindical no Egito
7 de março de 2012 at 1:06 pm Deixe um comentário
05 de março de 2012
Por Aldo Sauda
A revolução no Egito, que começou no dia 25 de janeiro de 2011 e esta longe de terminada, possui historias não contadas na grande imprensa.
Todos sabem dos jovens, com internet e celulares modernos nas mãos, que participaram da derrubada do ditador egípcio Hosni Mubarak. Infelizmente, a outra parte da historia, a dos milhões de trabalhadores e trabalhadoras que através do instrumento da greve geral derrubaram o regime, é muito pouco conhecida no Brasil.
Se não fosse pela greve geral, que literalmente parou todo país, muito provavelmente Mubarak ainda seria presidente do Egito.
A revolução anti-neoliberal
alguns meses antes da revolução, toda a imprensa e burguesia internacional olhava para o Egito como um grande exemplo para o mundo. Seu PIB (Produto Interno Bruto), considerado principal índice medidor da economia, crescia por volta de 7% ao ano. De longe, o país parecia uma maravilha. Porém, enquanto a economia crescia e a burguesia ficava mais rica, os trabalhadores, que viram quase todos seus direitos desaparecer durante estes mesmos anos, foram apenas se empobrecendo.
A ditadura egípcia, com ajuda do governo norte-americano, privatizou boa parte da economia do país. Se antes a economia era quase inteiramente estatal, os anos 2000 viram o Egito se juntar às outras economias neoliberais do mundo. Em pouco tempo, aquilo que antes era de todos passou para as mãos de alguns.
Além de privatizar, a ditadura também retirou direitos básicos do trabalhador, como o salario mínimo e garantias de aceso a serviços públicos. O projeto dos grandes empresários e do capital internacional eram claros; transformar o Egito na China africana: um país sem direitos sociais dirigido pelo grande capital internacional.
De greve em greve, por dentro e por fora dos sindicatos
O acenso dos trabalhadores egípcios, que eventualmente culminou na derrubada do regime, teve início entre os operários da industria tecelã em 2006. Revindicando o pagamento de bônus atrasados e melhores condições de trabalho, a greve vitoriosa dos tecelões foi a primeira grande mobilização da classe trabalhadora no país após décadas de descenso.
Para controlar o operariado, o governo egípcio fazia com que todos os sindicatos do país fossem dirigidos por sindicalistas pelegos, ligados ao partido do governo. O controle dos sindicatos se dava pela central sindical ligada ao partido do governo, que era a única permitida a funcionar antes da revolução.
Foi a partir da organização de greves por fora da estrutura sindical que a classe trabalhadora egípcia iniciou o ascenso politico que derrubou Mubarak. A greve dos tecelões em 2006 é um exemplo perfeito disto. Enquanto a direção pelega se colocou contra a greve, os trabalhadores e suas verdadeiras lideranças decidiram parar as fábricas independente da vontade da direção sindical.
De 2006 a 2011, a quantidade de greves no Egito foi dobrando de ano em ano. Petroleiros, Químicos, Portuários, servidores públicos, professores e trabalhadores da saúde, foram, de ano em ano, aumentando cada vez mais suas mobilizações. Em setembro de 2010, alguns meses antes do inicio da revolução, a classe trabalhadora egípcia já organizava a maior mobilização dos trabalhadores de toda a historia do mundo árabe.
O exemplo da Tunísia
Quando o povo da Tunísia, também com participação central do movimento operário de lá, derrubou em menos de um mês o ditador tunisiano Ben Ali, todos os países árabes pararam para assistir. A mensagem enviada da Tunísia, que sofria dos mesmos problemas econômicos que o Egito, foi clara. O povo organizado na rua consegue derrubar qualquer governo que quiser.
No dia 25 de Janeiro de 2011, 11 dias depois da derrubada do ditador da Tunísia, a juventude egípcia, cansada de desemprego, baixos salários, pobreza e injustiça social, tomou as ruas do Cairo, capital do país, para derrubar o ditador Hosni Mubarak.
Do dia 25 ao dia 28, o país foi marcado por embates campais entre os jovens e a policia. Todos os dias, milhões tomaram as ruas para protestar contra o regime corrupto. Delegacias foram incendiadas, carros de policia queimados e os presos políticos soltos das prisões pelo povo. O Egito iniciava uma revolução.
As lutas na rua, porém, não foram o suficiente para derrubar a ditadura. Manifestações de massa e o enfrentamento com a policia são instrumentos políticos importantes, mas sem que se pare o todo da economia de um país, dificilmente uma revolução se faz vitoriosa.
A greve geral
Os trabalhadores egípcios, que junto com os estudantes e jovens desempregados se manifestavam quase todos os dias, iam aos protestos, inicialmente, enquanto indivíduos.
Foi apenas após quase uma semana de protestos, que os trabalhadores viram que a revolução pouco se diferenciava de suas lutas do dia a dia por melhores condições de vida. A partir daí, deixaram de agir enquanto indivíduos lutando contra o sistema para agirem enquanto classe social.
No dia 2 de fevereiro, a liderança operaria, que pelo lado de fora dos sindicatos pelegos vinha organizando a luta dos trabalhadores, decidiu fundar uma central sindical independente dos patrões e do governo. Logo em seguida, declararam a greve geral. O objetivo da greve era claro; fim do regime ditatorial, da central pelega ligada ao partido do governo e do neoliberalismo no Egito.
Frente a mobilização da classe trabalhadora, a burguesia, junto aos militares, viram que a situação no Egito era insustentável. Ou sacrificavam Mubarak, entregando o anel, ou correriam o risco de perder toda a mão.
A aliança da juventude com os trabalhadores podia muito bem atingir os soldados e jovens oficiais do exercito. A possibilidade de que os soldados voltassem as suas balas contra Mubarak seus generais, avançando ainda mais a revolução, aterrorizou a burguesia e os generais.
No dia 11 de fevereiro de 2011, sob temor do avanço da revolução, os generais egípcios depuseram o ditador Hosni Mubarak.
Apear dos trabalhadores e dos jovens não terem assumido o poder, a derrubada do ditador, mesmo que por seus antigos aliados, foi uma vitoria histórica pra classe trabalhadora árabe!
A luta continua!
Apesar das promessas dos generais de entregar o poder para o povo, a classe trabalhadora egípcia, ao lado da juventude, sabe de que lado esta a junta militar que agora governa o país. Junto a burguesia e os religiosos islâmicos, o exercito tem se mobilizado para impedir o avanço da revolução. Enquanto dizem estar ao lado do povo, reprimem os jovens e atacam as greves, que não param de crescer no Egito.
Após a queda de Mubarak, a nova central que organizou a greve geral passou não só a crescer exponencialmente na base, como a ganhar diversos sindicatos, até então controlados pelos pelegos. Hoje, um ano após a revolução, a nova central possui mais de 2 milhões de trabalhadores em sua base.
O mês de setembro de 2011, foi um mês particularmente positivo para a classe trabalhadora. Uma serie de greves, organizadas pela nova central, parou o país. As greves de setembro foram as primeiras a contar com um processo real de coordenação nacional, conseguindo paralisar por volta de 700 mil trabalhadores.
O mês de setembro viu professores exigindo aumento salarial, portuários exigindo melhores condições de trabalho, trabalhadores do transporte exigindo o fim dos contratos temporários… enfim, a classe trabalhadora exigindo seus direitos.
A revolução no Egito e principalmente a organização da classe trabalhadora, representa as esperanças de todo o Oriente Médio pela construção de um novo mundo, sem oprimidos nem opressores. Para isto, porém, muito trabalho de organização da classe ainda será necessário. Novas batalhas virão, tanto contra a burguesia e os militares, que continuam no poder, como contra o imperialismo americano e europeu. A luta, ou melhor, a revolução, continua.
Aldo Sauda – é jornalista brasileiro. Vive no Cairo desde início dos protestos.
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